Entenda a complexidade da fibromialgia, uma doença silenciosa
- 1 de fevereiro de 2021
- 11:44
- Talitha Benjamin
Para quem convive com a fibromialgia, dores incapacitantes fazem parte da rotina. Atualmente, 37% da população brasileira vive com algum tipo de dor crônica e, na maioria dos casos, essa síndrome silenciosa é a culpada. Mais de 2% dos brasileiros – em sua maioria, mulheres – vivem com essa doença, que além das dores extremas, pode gerar ainda mais transtornos.
A fibromialgia causa, principalmente, dores crônicas e generalizadas em diversas partes do corpo. Na maior parte das vezes, essas dores são insuportáveis e, além da dor, outros sintomas como sensibilidade extrema em articulações, músculos e tendões, cansaço e distúrbios do sono podem agravar o quadro. Além disso, a intensidade dos sintomas pode influenciar no emocional e na vida ativa do paciente, podendo desencadear doenças como depressão e ansiedade.
Como identificar os sintomas da fibromialgia?
(Dra. Thaysa Simões)
Doutora Thaysa Simões Paixão Passalini, médica especialista em reumatologia pela Universidade de São Paulo e pela Sociedade Brasileira de Reumatologia explica que a fibromialgia é considerada como uma síndrome de “amplificação dolorosa”, justamente porque apresenta um conjunto de sintomas e alterações no paciente.
“O que costuma ocorrer é que, estímulos que não se esperam causar tanta dor assim, como, por exemplo, um abraço ou um toque, podem ser percebidos como uma verdadeira fonte de sofrimento.”
Ainda segundo a médica reumatologista, o conjunto de sintomas causados pela fibromialgia envolve dores crônicas e generalizadas por mais de 6 meses, alterações de humor (que podem incluir tristeza e ansiedade) e alterações no sono (insônia, sono irregular e cansaço extremo).
Gabriela Cassioti Gussoni, de 23 anos, descobriu a fibromialgia cedo, ainda aos 18 anos: “tive uma dor absurda no ombro no final da minha adolescência que acabou se estendendo até a ponta dos dedos. Cheguei a perder o movimento do braço direito por alguns dias”, recorda ela.
Em outra instância, ela também perdeu os movimentos das pernas por causa de uma dor que irradiava do quadril: “quando eu estou em períodos que as dores são piores, eu não consigo dormir, nem comer e perco simplesmente toda a vontade de viver. Até tomar banho me deixa cansada como se eu tivesse corrido uma maratona”.
Para Gabriela Leite, também de 23 anos, as crises de dores crônicas começaram em 2016 após um acidente doméstico envolvendo uma queimadura grave, e continuaram desde então.
“Eu nem sempre demonstro que estou com dor, porque nem todo mundo entende. Quando tenho atividades que exigem ficar muito tempo fora de casa, preciso estar sempre preparada com remédios mais fortes para remediar as crises”, desabafa.
A dificuldade do diagnóstico da fibromialgia
(Gabriela Cassioti Gussoni, 23 anos)
A única forma de identificar a fibromialgia é por meio de um diagnóstico clínico realizado por um médico qualificado e experiente. Dra. Thaysa explica que ainda não se sabe exatamente o que causa os sintomas da FM: “basicamente o que acontece é uma alteração na ‘comunicação’ entre o sistema nervoso central (que processa e “entende” um estímulo como dor) e o sistema nervoso periférico (os receptores que “captam” os estímulos pelo corpo e levam ao sistema nervoso central para o processamento)”.
O diagnóstico só é efeito através da comunicação entre médico e paciente para entender os sintomas e examinar outras possibilidades. Exames podem ser solicitados para descartar outras doenças, porém, não existe nenhum procedimento que detecta a FM. No entanto, Dra. Thaysa reforça: “isso ocorre não porque ela seja psicológica, e sim porque ainda não temos testes disponíveis que identifiquem essas alterações químicas que levam a ocorrência da fibromialgia”.
No caso de Gabriela Cassioti, as primeiras idas ao hospital foram marcadas pelo descaso e pela falta de conhecimento dos profissionais: “o médico colocou a culpa das dores no meu peso e disse que eu devia me exercitar mais. Infelizmente, isso continuou a acontecer toda vez que eu ia no hospital com dores, acabei emagrecendo 40 kg pois eu achava que as minhas dores eram devido ao fato de eu ser gorda.”
Já para Gabriela Leite, cuja mãe e a tia já são diagnosticadas com fibromialgia, o diagnóstico foi feito clinicamente, com o descarte da possibilidade de outras doenças.
Como tratar a fibromialgia e conviver melhor com a doença?
(Gabriela Leite, 23 anos)
Por causa das dores incapacitantes, a fibromialgia costuma afetar muito o cotidiano do paciente. No caso de Gabriela Leite, uma simples “virada” de tempo pode afetar todo o seu dia: “é quase certeza de cancelar o compromisso porque as dores vão me deixar de cama. É muito frustrante e, nem sempre, a gente encara isso com bom humor”, conta ela.
A médica especialista em reumatologia explica que as causas da fibromialgia ainda são desconhecidas pela medicina, por isso, o tratamento indicado após o diagnóstico da síndrome age diretamente para aliviar as dores e os outros sintomas.
“Precisamos identificar em cada paciente o que pode estar levando às crises e corrigir pra valer: melhora do sono, do condicionamento físico, medidas de como lidar com stress, técnicas de relaxamento, promoção de autoconhecimento, terapia cognitiva comportamental, entre outros.”
A atividade física regular é comprovadamente mais eficiente em aliviar os sintomas da fibromialgia. Dra. Thaysa recomenda que o paciente escolha a atividade que mais combine com o seu perfil, que o motive e que o deixe à vontade. A alimentação saudável e balanceada e o controle do peso também ajudam.
Dependendo do caso, a prescrição de medicamentos se torna necessária para atenuar a dor, no entanto, apenas em conjunto com um tratamento mais completo, envolvendo outras formas de alívio dos sintomas. Dra. Thaysa garante que, com um tratamento seguido à risca e feito por um profissional qualificado muitos pacientes conseguem ter uma vida normal ou muito próximo disso, com crises esporádicas.
Gabriela Cassioti destaca a importância de prestar atenção ao que o corpo tem a dizer para melhorar a qualidade de vida: “eu sou muito teimosa, então aprendi muito tarde a descansar e até agora os hábitos que funcionaram pra mim foram a terapia, alongamento e caminhadas, fisioterapia e massoterapia. Além disso, descansar entre uma atividade e outra também pode ajudar”.
O consenso entre pacientes e especialistas é de que a fibromialgia deve ser tratada com delicadeza tanto por pacientes, quanto por médicos e familiares do paciente: “ a verdade é que não é fácil para a pessoa com esses sintomas conseguir superar sem muito apoio e empatia de quem a cerca, pois precisam de força”, reforça a médica especialista em reumatologia.
Para quem precisa conviver com a fibromialgia, Gabriela Cassioti afirma que a melhor forma de encarar a doença é saber que você não está sozinho: “existem muitas pessoas ao redor do mundo que sofrem do mesmo problema e que podem te apoiar e entender quando muitas vezes as pessoas próximas de você não entendem. A fibromialgia é uma doença crônica séria e precisa ser tratada como tal, mesmo que não tenha sintomas visíveis”.